ARMINIANISMO NA ESTRADA DE DORDT

Arminianismo na estrada de Dordt
Lucio Mauro

Jakobus Arminius (Jacó Armínio) era um pastor das Igrejas Reformadas Holandesas. Nasceu em 1560, em Utrecht; estudou em Leiden; foi para Genebra e estudou com
Beza, de quem admirava os escritos. 

Em 1588 foi ordenado pastor em Amsterdã. Seu aluno, Plancius, se opôs a sua teologia, mas isso não foi suficiente para impedir sua nomeação como professor na universidade de Leiden. Gomarus, também professor, um supralapsariano, passou a disputar com Armínio por causa de sua posição sobre fé e graça. 

Armínio nunca era claro em suas afirmações. Por exemplo, ele queria a revisão das confissões, mas não explicava porque havia necessidade de mudança nos padrões de fé da igreja. Em 1608, Gomarus e Armínio apresentaram-se diante da coorte para expor suas opiniões. Armínio não estava muito satisfeito com essa opção, pois seu interesse era a convocação de um sínodo.

Armínio morreu em 1609. No ano seguinte, 41 pastores e alguns professores que apoiavam a teologia de Armínio (pelo menos em parte, pois muitos negavam o pecado original e a depravação total, que eram defendidos por Armínio) reuniram-se para elaborar um documento de consenso a fim de ser apresentado ao governo dos Estados Holandeses - este documento ficou conhecido como Artigos da Remonstrância (Remonstrantie). Este grupo não queria a manutenção dos símbolos de fé (Catecismo de Heidelberg e Confissão de Fé Belga) como norma para a igreja, apesar de não negar sua validade. Seu principal representante foi Simon Episcopius (1583-1643) e Hugo Grócio (1583-1645).

Anos mais tarde, foi convocado o Sínodo de Dordrecht (1618-1619) do qual herdamos a forma inglesa Dordt (com alguma corrupção "Dort"). Ele teve a sua primeira sessão na manhã de 13 de novembro de 1618, terminando no ano seguinte, com a sessão de número 154, em 9 de maio de 1619. 84 Teólogos, entre esses estavam 27 delegados da Alemanha, Suíça, Inglaterra e outros países da Europa, e 18 representantes seculares. 

O Sínodo de Dordt condenou os ensinos dos remonstrantes. Todos os remonstrantes que exerciam o ofício de pastor foram depostos e os que ocupavam cargos públicos foram destituídos e expulsos da Holanda. No entanto, grupos remonstrantes permaneceram na Holanda e Alemanha e podem ser encontrados até hoje. A Irmandade Remonstrante tem atualmente cerca 6000 associados na Holanda, mas também na Alemanha.

Alguns têm feito ligação estreita entre a expressão Os Cinco Pontos do Calvinismo com John Calvino, mas Calvino nunca usou tal expressão nem tratou os temas na estreita relação como eles se apresentam hoje. A expressão somente ganhou notoriedade a partir de Dordt. Os Cinco Artigos da Remonstrância e posteriormente os Cinco Cânones de Dordt podem ser indicados como fontes para Os Cinco Pontos do Calvinismo, ainda que de maneira indireta, pois existem diferenças na ordem dos assuntos.

Armínio afirmou a depravação total, mas acreditava que a graça preveniente permitiria que os homens escolhessem a salvação. Concernente a graça e livre-arbítrio, Armínio disse "isto é o que eu ensino conforme as Escrituras e o consentimento ortodoxo: o livre-arbítrio é incapaz de iniciar ou aperfeiçoar alguma bondade verdadeira e espiritual, sem a graça. Essa graça [prœvenit] vem antes, acompanha, e segue; anima, assiste, opera em nossa vontade, e coopera para que a nossa vontade não torne-se vã."

A seguir, a transcrição dos Cinco Artigos da Remonstrância:

Artigo I - Que Deus, por um eterno e imutável plano em Jesus Cristo, seu Filho, antes que fossem postos os fundamentos do mundo, determinou salvar, de entre a raça humana que tinha caído no pecado – em Cristo, por causa de Cristo e através de Cristo – aqueles que, pela graça do Santo Espírito, crerem neste seu Filho e que, pela mesma graça, perseverarem na mesma fé e obediência de fé até o fim; e, por outro lado, deixar sob o pecado e a ira os contumazes e descrentes, condenando-os como alheios a Cristo, segundo a palavra do Evangelho de Jo 3.36 e outras passagens da Escritura.

Artigo II - Que, em concordância com isso, Jesus Cristo, o Salvador do mundo, morreu por todos e cada um dos homens, de modo que obteve para todos, por sua morte na cruz, reconciliação e remissão dos pecados; contudo, de tal modo que ninguém é participante desta remissão senão os crentes.

Artigo III - Que o homem não possui por si mesmo graça salvadora, nem as obras de sua própria vontade, de modo que, em seu estado de apostasia e pecado para si mesmo e por si mesmo, não pode pensar nada que seja bom – nada, a saber, que seja verdadeiramente bom, tal como a fé que salva antes de qualquer outra coisa. Mas que é necessário que, por Deus em Cristo e através de seu Santo Espírito, seja gerado de novo e renovado em entendimento, afeições e vontade e em todas as suas faculdades, para que seja capacitado a entender, pensar, querer e praticar o que é verdadeiramente bom, segundo a Palavra de Deus (Jo 15.5).

Artigo IV - Que esta graça de Deus é o começo, a continuação e o fim de todo o bem; de modo que nem mesmo o homem regenerado pode pensar, querer ou praticar qualquer bem, nem resistir a qualquer tentação para o mal sem a graça precedente (ou preveniente) que desperta, assiste e coopera. De modo que todas as obras boas e todos os movimentos para o bem, que podem ser concebidos em pensamento, devem ser atribuídos à graça de Deus em Cristo. Mas, quanto ao modo de operação, a graça não é irresistível, porque está escrito de muitos que eles resistiram ao Espírito Santo.

Artigo V - Que aqueles que são enxertados em Cristo por uma verdadeira fé, e que assim foram feitos participantes de seu vivificante Espírito, são abundantemente dotados de poder para lutar contra Satã, o pecado, o mundo e sua própria carne, e de ganhar a vitória; sempre – bem entendido – com o auxílio da graça do Espírito Santo, com a assistência de Jesus Cristo em todas as suas tentações, através de seu Espírito; o qual estende para eles suas mãos e (tão somente sob a condição de que eles estejam preparados para a luta, que peçam seu auxílio e não deixar de ajudar-se a si mesmos) os impele e sustenta, de modo que, por nenhum engano ou violência de Satã, sejam transviados ou tirados das mãos de Cristo (Jo 10.28). Mas quanto à questão se eles não são capazes de, por preguiça e negligência, esquecer o início de sua vida em Cristo e de novamente abraçar o presente mundo, de modo a se afastarem da santa doutrina que uma vez lhes foi entregue, de perder a sua boa consciência e de negligenciar a graça – isto deve ser assunto de uma pesquisa mais acurada nas Santas Escrituras antes que possamos ensiná-lo com inteira segurança.

"Estes artigos, assim definidos e ensinados, os Remonstrantes consideram de acordo com a Palavra de Deus, tendendo a edificação, e, no que diz respeito a este argumento, suficiente para a salvação, de modo que não é necessário ou edificante acrescentar ou diminuir qualquer coisa."

Fonte: History Of The Christian Church, Philip Schaff, Hendrickson; The Creeds of Christendom, Philip Schaff, Baker.
 

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